Diante desse tumulto todo que foi
a entrada da arte-educação na minha vida, eu entrei em depressão. Entrei em
depressão e fui parar na psiquiatra. Não me importo em dizer, de longe foi uma
das melhores coisas que me aconteceu. No início eu tive que tomar um remédio,
mas de acordo com a evolução do tratamento, eu pude eliminar o remédio e ficar
só com a terapia.
Nesse espaço de tempo comecei a procurar
coisas que eu realmente gostava da fazer e redescobri meu gosto pelo desenho.
Encontrei um site de rede social especializado na divulgação de arte/artesanato
em geral chamado DeviantArt (DA). Frequentando ele, descobri que existiam
muitas pessoas que eu julgava ter um nível de desenho abaixo do meu, expunham
seus trabalhos e muitas pessoas adicionavam esses trabalhos como “favoritos” e
comentavam.
Por conta disso, resolvi criar um
perfil e adicionar os meus desenhos, ganhei alguns comentários e fiquei feliz,
comprei uma mesa digitalizadora, fiz mais desenhos e ganhei mais alguns “seguidores”
e isso foi me estimulando a desenhar melhor. Procurei tutoriais na internet em
forma de imagens, vídeos e etc. Procurei estilos de desenhistas para referência
no próprio DA e fui devagarinho me aperfeiçoando.
Devo admitir porém que não
busquei me aperfeiçoar em desenho com base no que eu aprendi e estava
aprendendo na disciplina de desenho na universidade. Acredito que isso não tenha
acontecido por dois motivos. O primeiro é que em geral eu tenho muita dificuldade
em absorver os conteúdos explicados em disciplinas, quando as coisas são
obrigatórias elas perdem a graça e eu acabo por fazê-las só por obrigação. Uma
vez que desenho é uma disciplina obrigatória e eu tinha que concluí-la isso fez
com que aquilo se tornasse chato e feito somente por obrigação, sendo assim eu
não consegui permitir absorver os aprendizados, fazia só por fazer.
O segundo fato é que essa
dificuldade de absorção de conteúdos diante de coisas obrigatórias agravou
depois de um episódio de desentendimento entre eu e o professor que lecionava a
disciplina de Desenho I, no primeiro semestre do curso. Em sua segunda aula,
ele pediu que todos os alunos fizessem um desenho livre (creio que para avaliar
os conhecimentos na área que a turma em geral possuía). Eu fiz um desenho qualquer
(homens em um castelo atirando fechas e lanças em um dragão voador que soltava
chamas) com uma qualidade técnica bem péssima, (alguns homens eram até de
palitinho) mas o que eu queria passar com aquele desenho é que em geral meu
conhecimento de desenho era baixo ou nulo.
Passando pelo meu desenho o
professor olhou e disse que estava ruim, que era pra eu jogar fora (sim, jogar
fora no lixo) e fazer um novo. Não lembro se fiz, mas se fiz foi muito a contra
gosto, porque não consegui entender bem como um desenho livre poderia estar
errado. Em outra aula, ele pediu que trouxéssemos um desenho de natureza.
Sinceramente não lembro que desenho que eu fiz, mas dessa vez tentei me
empenhar mais para que ele não quisesse jogar meu desenho fora. Esse professor
fazia questão de passar de desenho em desenho com a turma toda reunida em volta
dele para dar seu aval. Quando finalmente chegou ao meu, ele olhou e não fez
críticas sobre as técnicas como vinha fazendo com os outros, simplesmente tirou
do bolso da blusa um cartão vermelho (desses de juiz de futebol) e disse: “para
o seu desenho, cartão vermelho!” e levantando o cartão em minha direção deu uma
grande e sonora gargalhada, que fez com que a turma toda se juntasse a ele.
Não bastando esse último episódio
constrangedor, ainda existiu outra aula em ele pediu que fizéssemos em casa um
desenho utilizando a técnica de aquarela. Ele não ensinou nada sobre aquarela,
e quando eu cheguei na aula com meu desenho, ele disse que estava errado e não
era assim que era utilizada a aquarela. Ainda tentei perguntar como era feita a
utilização dessa técnica, mas fui completamente ignorada. Não conseguindo
compreender qual era o real propósito daquela aula e como o professor julgava
os trabalhos, desisti da disciplina.
Aqui posso fazer de novo um link
com o que estava discutindo em arte-educação ali em cima. Para todas as
disciplinas da universidade existe uma ementa, e ementas servem para serem seguidas.
A ementa das disciplinas de desenho foi pensada para todos os tipos de alunos
que ingressam nesse curso de artes. Na universidade na qual me encontro, não existe
prova de habilidades artísticas, nem em desenho e nem em qualquer outra
disciplina de aprendizado técnico. Sendo assim, não se pode julgar errado em
questão de conhecimento técnico um desenho que foi considerado de cunho livre.
Também não se pode julgar errado o uso da técnica aquarela sendo que não foi
previamente ensinada. Aliás, aquarela nem está não está na ementa de Desenho I.
O que aconteceu foi que, logo no
meu primeiro período do curso de artes, me deparei com um professor, do qual
não apresentou a ementa, não apresentou cronograma de aulas e principalmente
não seguiu (nem de longe) o que era proposto na ementa. Levou em conta o
talento (talento aqui vai tanto para os que dotavam de conhecimento técnico
quanto para os que não o tinham, mas tinham potencial e/ou sabiam utilizar
desses conhecimentos mesmo não os tendo estudado) de alguns, desprezou os
outros, passou os “queridinhos” com notas altas e os não eram com notas 5,0.
Enfim, apesar desses
acontecimentos terem de alguma forma bloqueado meu desejo de desenhar por um
período de tempo, logo que entrei para a terapia e encontrei o DeviantArt eu
consegui supera-lo e hoje gosto muito de desenhar e quero aprender cada vez
mais.
Dentro dos meus desenhos e dos
desenhos que tomei como referência, encontrei a ilustração. Porém a ilustração
é o que eu denominei no começo do texto de arte-não-arte. Ilustração não é
artesanato e também não é arte (apesar de eu achar que sim, é arte). O problema
todo da arte é que quando houve o rompimento para a arte contemporânea, passou
a existir uma aversão a tudo que ficou pra trás do rompimento. Toda produção artística
daquela época, continuou sendo considerado arte, porém não se podia mais
utilizar daqueles daquele mesmo pensamento para criar arte contemporânea. Sim,
eu compreendo o rumo da história da arte e a necessidade do rompimento, eu também
compreendo a aversão. A arte “evoluiu” passou de ser só técnica para ser
pensamento.
O que eu entendo, porém, é que o
tempo em que se deu o rompimento, também já passou, e hoje a necessidade talvez
seja outra. Eu não consigo ver hoje, a arte só como pensamento. Eu acredito
numa arte em que a mensagem a ser passada é a mesma para todos que apreciam. A
professora da disciplina de “Arte não Escolar”
escolar estava criticando em uma aula dela uma das fases do artista brasileiro
Artur Barrio, dizendo que achava que em suas obras chamadas “Trouxas
Ensaquentadas” (em que numa época de ditadura brasileira ele cria trouxas
feitas de saco de farinha contendo sangue e várias outra coisas consideradas
nojentas e espalha pela cidade do Rio de Janeiro) o artista teve uma fase ruim
pois em geral não considerava as trouxas como obra de arte já que a mensagem
que ele quis passar com elas era muito clara e todo mundo entendia, ou se não
entendia, ao menos compartilhava do
mesmo sentimento de horror que elas causavam.
Então, quer dizer que só porque
não há uma multiplicidade de questionamentos e sentimentos diante de uma obra,
ela deixa de ser arte? É por isso que ilustração não é arte? Porque exige
técnica e porque a mensagem que você quer passar é muito clara? Será que não
vamos superar isso? Acho tão complicada essa parte, do ser ou não ser arte.
Engraçado como os papeis foram trocados
né? Antigamente ser o detentor da técnica e fazer reproduções realistas era arte,
e só quem podia ter eram pessoas da elite. E agora o que é válido é somente o
pensamento, e só consegue compreender esse pensamento quem é da elite. Que
coisa...
Estou eu aqui, agarrada numa é arte-não-arte,
porque não cabe no universo da arte mas também não cabe no artesanato. É o pior
é que é assim para todas as artes manuais das quais eu me interessei.
Fotografia por exemplo, se você não tiver o olhar artístico (o que em
fotografia complica mais ainda, o julgamento) não conta, foto por foto todo
mundo tira. Em cerâmica também, em serigrafia também. Em que espaço que eu estou?
Eu sinceramente não quero me
considerar artista, não ainda. Não quero vestir essa manta de que tenho um quê
de que ninguém consegue entender. Quero me fazer entender por tudo que eu fizer
e algum dia, eu fizer algo para considerar obra de arte, eu quero que entendam
da mesma forma que eu entendi. É minha arte, e daí? Eu tenho o direito de
querer explica-la, eu tenho o direito de querer que todo mundo entenda de uma
maneira só, e não, eu não concordo que isso resultará na perda da sua essência.
Eu não me canso de olhar algumas ilustrações e me perder nos detalhes que saíram
da mente daquela pessoa, de me encantar, de passar horas pensando sobre aquilo,
mesmo entendendo a mensagem que quis ser passada.
Existe um artigo do Thierry De
Duve que eu li chamado Quando a forma se transformou em atitude – e além, que
fala justamente sobre essa passagem do rompimento da arte antiga para a
contemporânea e como a academia ficou diante disso tudo. Ele não tem uma
conclusão no final do artigo, mas é interessante pra gente pensar. Creio que
isso justifique um pouco o pensamento de alguns professores como esse que
lecionou desenho no meu primeiro período.
Muitos ainda estão agarrados lá
no rompimento, e acreditam que técnica não é mais arte e inibe o pensamento
criativo de casa um. Mas veja, se você detém o conhecimento, pode fazer
inúmeras coisas com ele, e se você não o tiver, aí sim vai ficar podado.
Conhecimento nunca vai impedir a criatividade, conhecimento caminha junto com a
criatividade, quanto mais aprendemos, mais aumentamos nossa visão. E como eu já
disse também, passar o conhecimento técnico não significa que está eliminando
outras possibilidades.
Eu tive professores magníficos em
outras disciplinas e até mesmo em desenho, que souberam passar a técnica como
era prevista na ementa e ao mesmo tempo souberam apresentar como elas foram
utilizadas na arte contemporânea. Acredito também que da parte dos alunos é interessante
saber filtrar, temos que entender que entramos na universidade para aprender o
que for que estiver lá, para fazer os exercícios propostos, e se não for do
nosso interesse é só não utilizarmos mais em nossos trabalhos pessoais. Claro
que não é pra ficarmos cegos e não criticar as coisas, nada cresce se continuar
do mesmo jeito pra sempre, mas cabe a nós (e também aos professores) ponderar
um pouco antes de julgar e/ou criticar a proposta de ensino.
Por fim, depois de tudo que
passei, posso dizer que ainda me sinto um pouco perdida, ainda não sei se me
encaixei na arte da maneira como ela é vista hoje, e de novo eu digo: eu entrei
para Artes e me deparei com a Arte (e fiquei perdida: Parte III). Não sei se o que faço com as ilustrações é
arte, mas penso que se não for também, não tem problema. O importante é que no
fim depois de tantos desapontamentos eu descobri que gosto de desenhar e gosto bastante
de artesanato em geral também. Sim, artesanato mesmo, pintar caixinhas, encapar
e costurar cadernos dentre outras mil outras possibilidades do artesanato.
Eu amo muito tudo que é manual e
tudo que requer técnica. Todos os testes vocacionais que já fiz até hoje,
nenhum deles foi voltado para a área de humanas, e muito menos para artes.
Chega a ser engraçado né? Minha mente é um tanto lógica, e é por isso que eu
gosto das coisas certinhas e com sentido. Hehehe. De fato eu não gosto muito de
arte erudita, na verdade, não que eu não goste, eu acho bacana muitas das
exposições, eu só não gosto de ficar lá, horas tentando entender do que se
trata aquilo tudo e não gosto muito de como funciona os espaços expositivos.
Às vezes eu tenho uma revolta
enorme contra essas coisas todas que discuti aqui no texto e quero vestir a
camisa e lutar por todas essas causas que acredito, mas por outro lado é muita
briga pra ser comprada e talvez eu prefira fazer ilustrações e artesanatos e
ser feliz. (:
É um pouco triste, eu sei.
Afinal, se as pessoas não se mobilizarem para fazer valer o que elas pensam nada
vai pra frente. Mas essa luta me parece muito árdua e meu objetivo de vida por
enquanto é ser feliz. Acaba que isso se volta um pouco pro meu Trabalho de
Conclusão de Curso. Às vezes eu queria fazer algo simples, só pra formar, já
foi um vai e volta nessa área de artes e às vezes eu quero abraçar o mundo e
discutir minunciosamente cada tópico que me aflige.
Bom, acho que é isso.
Provavelmente ficou faltando coisa, já que o universo da arte é enorme e meus
pensamentos também. Mas por fim, quase no fim do curso eu consegui por metade
dos pensamentos em ordem. Estou feliz por isso, por muito tempo eu adio
escrever um texto voltado para isso.
Antes de ir, devo de dizer que
acredito que talvez, alguns dos meus questionamentos podem ser por falta de
maturidade no assunto, ou maturidade pessoal. Mas que mesmo se forem, são
válidos para o momento em que vivo agora.
Outra coisa que é uma grande
falha minha, é que eu não procuro textos sobre nada disso para basear meus
argumentos. Mas sabe, eu creio que se eu não os procuro é porque não me
interesso tanto e isso ajuda na hora de eu não querer comprar briga. Em geral, eu
costumo pesquisar as coisas que me interessam, do contrário hoje meu desenho
continuaria no mesmo nível de quando comecei.
Enfim, no dia que
existir uma Parte IV desse texto eu tentarei escrevê-la, talvez daqui até final
do curso mais coisas possam ser compreendidas, né não? Mas por enquanto, fiquem
com esses poucos parágrafos aí. Fim da
parte III.
inté mais ver! (: